Por Wilson Solon.
Em função das várias combinações possíveis entre as componentes psicológicas e ideológicas da mente humana, torna-se oportuno recapitular os conceitos absolutos que muitos insistem em ver como “relativos”.
A rigor, relativizações são válidas somente para as oscilações pessoais: ora das emoções (entre o altruísmo e o egoísmo extremo, como o ódio patológico), ora da razão (entre a ignorância e a lucidez, ou a sabedoria decorrente). Nas ideologias, analogamente, nossa análise geométrica já localizou o ‘ponto de equilíbrio’ absoluto na sanidade e na dignidade da natureza humana, vale dizer, à esquerda do espectro ideológico.
De fato, por convenção, podemos localizar a “normalidade” (física e mental) em qualquer outro ponto. Mas o próprio afastamento do equilíbrio natural já fornece as respectivas medidas dos conflitos visíveis (e nem sempre compreensíveis) – seja no indivíduo, seja na sociedade (sobretudo nas capitalistas).
Em outras palavras, qualquer subgrupo social (político ou econômico), quando retira o foco da sociedade e o transfere para o tal mercado, contribui na mesma medida para aumentar os indicadores de miséria e corrupção. Assim como o indivíduo adoece quando afasta o seu referencial emocional do homem. E tende a corromper-se à medida que o aproxima do capital.
O indivíduo ideológico
Para um cidadão de esquerda, portanto, haverá duas alternativas somente: se for altruísta, desfrutará de seu equilíbrio emocional e paz de espírito (exceto, é claro, sob o ataque de golpistas); se for egoísta (ou mais um ambicioso desvairado), enfrentará o incômodo juízo da consciência (outra componente psíquica natural dos seres humanos). Por outro lado, contará também com um guia eficaz para retornar ao equilíbrio: a própria ideologia social.
Já a “lógica” mental da direita só pode ser resumida no conceito de ‘caos’. Embora, para os sofistas, este seja também uma componente psíquica “natural”. Mas não discutimos em que recanto da natureza cada qual escolheu viver, apenas as alternativas mais favoráveis à vida. E quem escolhe o capital como referência, de fato terá tantas opções quanto o capitalismo lhe pode oferecer: a imponderável excitação dos lucros, a trepidante flexibilidade do mercado, ou a sedutora liberdade de se atirar em algum abismo.
Para os capitalistas mais fervorosos, ser ou não egoísta tem menos importância do que a volúpia em si de acumular. Não obstante, se o capitalista for também altruísta, talvez um dia compartilhe sua fortuna, ao menos com os seus eleitos. Mais difícil será perceber quando o seu patrimônio já engordou o bastante para começar a exercitar a generosidade.
Nesse turbilhão de emoções irreais, inevitavelmente, os problemas reais começam a surgir quando o intelecto é perturbado; a seguir, deliberadamente relativizado (sobretudo com a ajuda da mídia capitalista); até que os olhos sejam obrigados a voltar-se para o mundo real: o indivíduo, quando afinal vê frustradas as suas expectativas no meio social; e a sociedade, quando percebe que nunca será capaz de suprir todas as expectativas individuais. Matematicamente, nem sequer suas necessidades elementares.
Corrupção ideológica
Mas prossigamos pelas densas florestas das ideologias, na árdua tarefa de fotografar as raízes da corrupção, antes ocultas. Ou desprezadas, pois pareciam alimentar apenas algumas “ervas daninhas” (do PT e aliados). Hoje já as vemos contaminar os melhores frutos da produção nacional – do petróleo à construção civil. Entre outros efeitos literalmente daninhos a biomas inteiros – como a Amazônia. A lista, enfim, não caberia neste espaço.
Não obstante, neste percurso, manteremos sempre nossas câmeras lado a lado com as da Globo, como pontos de vista (jamais como propagandistas dos mesmos descalabros, evidentemente). E sem dispensar nenhuma das ferramentas (históricas, geométricas e estatísticas) já utilizadas. Em especial, as psíquicas, doravante indispensáveis para atravessar os territórios mais espinhosos.
Muitas vezes, as ideias universais e os paradigmas do plano “imaterial” (ideal, psíquico, espiritual) podem ser mais eficazes do que os estreitos limites econômicos ou partidários (à exceção dos partidos cujas práticas sejam também universais), para afinal evidenciar o que, nas ditas “ciências” humanas, ainda parece imensurável.
Mas sobretudo para os analistas políticos mais “limitados” (como os da própria Globo), volto à falsa premissa já referida (sob o ponto de vista histórico), para descartá-la em definitivo: a “impossibilidade” de dimensionar as “metades” esquerda e direita do espectro político brasileiro. Antes reitero que elas são partes avassaladoramente desiguais. E acrescento: na proporção inversa do que se pensa e se vê representado, por exemplo, no Congresso Nacional (do qual logo extrairemos as contraprovas).
A ideologia natural
Quem, em sã consciência, afirmaria que os seres que respeitam os demais, ou a sociedade (mais do que os odeiam ou desprezam), seriam apenas “cerca de metade” da população? Tratemos de desconstruir esta falsa premissa da direita, e de comprovar a verdadeira: a bondade inata do ser humano. Do contrário, deveremos acreditar que metade da humanidade está enferma, o que não se conhece em nenhuma espécie natural na Terra.
A imensa maioria (ou a quase totalidade) da nossa espécie é saudável, por natureza. E generosa, (fosse somente) por autopreservação. Portanto, socialista, por definição. Ainda que não o saiba. Precisamente porque a imensa maioria (ou a quase totalidade) tampouco conhece as ideologias, a política, a economia; nem pensa sobre essas questões mais do que é obrigada a se alienar.
Obrigada por quem? A resposta é tão evidente quanto a primeira “razão” para a alienação: pelos capitalistas, é claro, quando nos convencem que os socialistas seriam, na melhor das hipóteses, apenas uma “metade”. Assim podem ocupar (pelo menos) a outra metade. Repito que eles jamais teriam tanto espaço na ordem natural, se não a subvertessem.
A ideologia corrompida
Não por acaso, os instrumentos capitalistas “investem”, literalmente, nas duas componentes psíquicas que investigamos: nas emoções desvairadas, através das seduções consumistas (midiáticas e globalizadas); e na razão relativizada (como já vimos), através da divulgação de mentiras que, na aparência, seriam “indesmentíveis”. Na sua essência, o capitalismo fornece a dimensão da própria esquizofrenia.
Na mesma medida, suas premissas (ou promessas) materiais – o capital e o mercado – já começam por destruir o equilíbrio natural do espírito humano. A rigor, temos a primeira evidência (apenas matemática, admito) de um paradoxo ideológico: em qualquer sociedade, a soma das riquezas acumuladas pelos “senhores do mercado” é diretamente proporcional à miséria material dos demais.
No plano “imaterial”, esse desequilíbrio equivaleria à outra equação não menos matemática: das ambições exageradas e das frustrações inevitáveis. Talvez pareça abstrato quantificar essas emoções esquizofrênicas – ou seja, tão reais quanto irrealizáveis estatisticamente (como as pretensões das multidões de ganhar, por exemplo, na mesma loteria). Por outro lado, falamos de efetivas energias psíquicas – ora apenas manipuladas, ora já patológicas – que poderiam ser utilizadas para o bem-estar pessoal e coletivo.
No Brasil, não seria sequer necessário reproduzir as cifras astronômicas (mas conhecidas) que dessangram o orçamento do Estado para amortizar apenas os juros das “dívidas” com os mercados financeiros. Em suma, esses números assustadores e as referidas psicopatologias, embora imateriais, servem para desmontar o igualmente falacioso paradoxo político: a “popularidade da direita”. Voltemos assim ao Congresso Nacional e às provas da esquizofrenia capitalista.
As ideologias na prática
Para nós brasileiros, sobretudo depois de conhecermos com clareza os dois lados da “moeda” (o perverso, de sempre, e o desenvolvimentista, como nunca antes do PT), intriga a eleição do parlamento mais reacionário e corrupto de todos os tempos. Para os simplistas, a causa mais óbvia seria autoexplicativa: o abuso do poder econômico nos processos eleitorais.
Ainda assim, por que a representatividade e a influência da direita se mantêm inversamente proporcionais à efetiva satisfação das carências dos eleitores? Na verdade, o “enigma aparente” já contém as duas contraprovas referidas. As “aparências” são, literalmente, a espinha dorsal de um duplo engano – a retórica capitalista em si, como discurso universal, e o corrupto neoliberalismo nacional.
A primeira contraprova – emocional – já demonstrou, ao fim dos governos petistas, que os brasileiros nunca antes estiveram mais assanhados com a prosperidade: os capitalistas, porque tinham os bolsos cheios, para exercer na plenitude o seu poder de sedução; o povo, porque encheu pelo menos o estômago, talvez o bastante para se despreocupar das antigas necessidades; e também sucumbir às seduções desnecessárias do capital e da propaganda midiática.
Ao Partido dos Trabalhadores, só faltou ser mais didático (e antes aprender) com o que parecia intuitivo, em uma democracia: uma vez que os marginalizados tivessem trabalho, cada vez menos marginais entrariam pelas nossas janelas. Com efeito, um projeto justo e poético. Mas, se não ingênuo, ainda incompleto.
Faltou prever o inimaginável: os assaltantes mais perigosos entrariam pelas telas da TV e corredores dos palácios governamentais e judiciais. Não menos surpreendente foi a esquerda não ter criado uma única alternativa de comunicação com os brasileiros, capaz de divulgar a sua versão do assalto. Ou antes, de tê-lo evitado.
Há ainda a segunda contraprova – racional – das fraudes ideológicas, com o inestimável suporte da Rede Globo: a campanha eleitoral da direita, em 2014, promoveu a mais “absoluta relativização” da razão, vale dizer, nunca mentira com tamanho despudor.
A população, por sua parte, através de seus representantes parlamentares, deixou explícita a sua alienação (ou “virtual” ignorância), referida há pouco, em relação à economia, a qualquer ideologia, e à própria política. Exceto na eleição majoritária, onde havia o contraponto das figuras empreendedoras de Lula e Dilma.
Diagnósticos
Hoje seria impreciso determinar se o Congresso, as assembleias legislativas e as câmaras municipais são órgãos tomados pelo câncer, e os eleitores são meras metástases, ou vice-versa. Mas podemos constatar, com precisão matemática, que todos adoecemos em algum nível.
Na melhor das hipóteses, os brasileiros comprometidos com os conceitos absolutos – de sanidade, dignidade e honestidade – padecem de profunda vergonha alheia, pelos assaltos à Democracia e à Ética. Por outro lado, todos (ou quem não sofre de miopia ideológica nem de ódio psicopatológico) conhecemos igualmente os alvos preferenciais dos traiçoeiros. Até que, não por acaso, os jogadores mais resilientes – como Dilma e Lula – fossem expulsos de cena.
Das teorias à prática, porém, quando o jogo deixa de ser democrático, também surgem cada vez mais provas das violências e trapaças (no caso presente, do consórcio PSDB, Rede Globo e respectivas conexões judiciárias), que sempre crescem proporcionais à resistência dos líderes mais genuínos e sadios.
Pelo menos enquanto a sociedade não admitir sua “virtual” epidemia moral. E decidir reagir, condição essencial para a cura. Feito isto, das ruas às urnas, são várias as terapias.
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