Por Wilson Solon.
Em que pese o ‘óbvio’ (ou antes, por seu didatismo), vale a pena recordar alguns dos horrores explícitos do (des)governo que (não) temos. Como foi antecipado, vamos aos fatos e às fotos de nossa tragédia nacional, que chamei de uma “seleção natural” às avessas.
O “Ministério do Vampiro”, como é visto popularmente, por ironia, nos permitirá conclusões ainda mais científicas do que as observações de Darwin, na medida em que nossos ministros de Estado – tanto quanto as elites e os partidos que representam – são exemplares de uma mesma “classe de animais”. Com efeito, moralmente corrompidos e já bastante conhecidos, mas ainda mal observados.
Em termos biológicos, podemos vê-los sob duas perspectivas opostas: lamentavelmente, como casos irremediáveis, pela própria decadência intelectual e moral; por outro lado, felizmente, como uma espécie em extinção, pelas próprias fraquezas seletivas (repito, às avessas). Ainda que seus perfumes de decência lhe assegurem uma efêmera sobrevida.
Mas sabemos também, com 100% de certeza, que as escolhas humanas se tornam, por si mesmas, a antítese do “acaso darwiniano”. Em outras palavras, os corruptos não o são por um determinismo geográfico, ou biológico, mas por decisões políticas em comum – ao livre-arbítrio de cada um dos envolvidos.
Antes dos ministros, porém, observemos os ministérios “principais” (ou que emergiriam, com rigor estatístico, de uma pesquisa popular ), seja pela relevância para o Brasil, seja pela proximidade e importância para os brasileiros. Critérios talvez aleatórios, mas ainda assim intuitivos e consensuais como os mais favoráveis à vida humana.
Educação, Saúde, Justiça, Relações Exteriores, Economia, Trabalho e Segurança, certamente figurariam nesta segunda “seleção natural” – dos ministérios imprescindíveis – quer para o Temer, em sua sanha demolidora da nação, quer para nós: como objetos de estudos que tanto desmentem a aleatoriedade como comprovam a intencionalidade e malignidade do consórcio entre o imperialismo e os traidores da pátria.
Reminiscências concretas de uma degeneração (ainda) abstrata
Na Educação, o ministro Mendonça Filho (do DEM) considerou “educativo” inaugurar o seu mandato midiático como anfitrião de um ex-ator global e pornô – apologista do estupro e protagonista de cenas públicas de agressão. Para ouvir dele “conselhos”, sobre o mais reacionário e rejeitado projeto de demolição das consciências críticas entre os jovens – conhecido como “escola sem partido” (a rigor, sem cérebro nem educação).
Na Saúde, Ricardo Barros (do PP), além de insensível aos dramas humanos que assolam as populações mais pobres, foi o primeiro titular deste ministério sem qualquer formação na área – desde 2003 – embora sua campanha a deputado tenha sido de fato financiada por um plano de saúde privado. O “Leitão Vesgo”, como é conhecido no Paraná, entre outras pérolas (que não caberiam neste espaço), afirmou que “resolveríamos tudo com um quinto dos hospitais do país”. Sem dúvida, cemitérios seriam mais baratos e adequados a seus propósitos.
Na Justiça, pouparei o leitor das performances do Alexandre de Morais (do PSDB), o exterminador “paraguaio” de pés de maconha (entre outras cenas bizarras divulgadas pela Globo), como neste vídeo. Mas destaco somente o partidarismo que o novo “juiz” arrastou ao STF, onde consolidou sua parceria jurídico-partidária com o não menos grotesco Gilmar Mendes. Quanto ao nível da justiça em nosso país, no entanto, já vimos o suficiente sob os pontos de vista (20, 21e 22 desta série) dedicados ao ‘Agente Moro’.
Nas Relações Exteriores, sobretudo na gestão de Celso Amorim (considerado o chanceler mais atuante do planeta), Lula e Dilma consagraram o Brasil como uma nova potência – econômica, política e social – aos olhos do mundo. Portanto, talvez bastasse registrar o absoluto anonimato a que fomos relegados, pela constrangedora subordinação dos golpistas aos EUA. Mas não. Caímos muito abaixo disso.
A começar pela bisonha atuação do José Serra (do PSDB) que, além de desconhecer quem eram os nossos parceiros dos BRICS (vídeo), não sabia sequer o nome do próprio País. Chamá-lo de República ‘dos Estados Unidos’ do Brasil (sic) seria apenas mais um atestado de sua notória ignorância (vídeo), não fosse também um lapso freudiano das verdadeiras intenções da quadrilha entreguista da nação.
Uma vez desmascarado como o maior corrupto entre seus pares (antes do Geddel, do PMDB), Serra delegou sua missão “diplomática” ao não menos suspeito Aloysio Nunes (também do PSDB), cujos pensamentos veiculados pela internet já falam (ou gritam, literalmente) por si: “Vai pra puta que o pariu”, ou “Eu vou comer o seu cu” (vídeo). Com efeito, registros emblemáticos da nova diplomacia brasileira.
Os enigmas econômicos
Entretanto, nenhuma figura poderia ter sido mais simbólica do desgoverno Temer do que o Henrique Meirelles (então no PSD), tanto pelos motivos conhecidos quanto pelo que permanece um mistério. Obviamente, ser o titular do Ministério da Fazenda – o mais importante na área econômica – exigiria um vasto currículo (nos EUA, é claro) como alto executivo do rentismo nacional e internacional.
Por outro lado, seus enigmas morais são tão impenetráveis que nem as Organizações Globo foram capazes de tocar no assunto. Tampouco seus “comentaristas” econômicos tiveram interesse em investigá-lo. Tratemos de auxiliá-los, a partir de um curioso paradoxo: a despeito do retumbante fracasso da política econômica e fiscal, por que o Meirelles nunca deixou de ser blindado pela mídia nem o “favorito do mercado”?
A questão seria irrespondível, pela lógica social da esquerda. Não obstante, pelo pragmatismo “mercado-lógico” da direita, talvez a pergunta já seja autoexplicativa. Mas avancemos para as obscuridades ainda mais desafiadoras acerca do Meirelles.
Como sabemos, o grupo J&F protagonizou o maior escândalo de subornos a políticos – de centro-direita – na história do País, o que foi amplamente divulgado pela Rede Globo e admitido pelos próprios donos da empresa. No período em que ocorreram alguns dos fatos mais escabrosos (entre 2012 e 2016), Henrique Meirelles foi o presidente desta holding, de onde saltou diretamente para o desgoverno do presidente usurpador.
Será que o Temer, até então insuspeito (para a Globo, claro), de fato não sabia do que todos sabemos que sempre soube? E quando afinal se tornou suspeito, por que a Globo não levantou a hipótese de que o multimilionário Meirelles também estivesse envolvido (como deduziu que o pobretão do Lula recebera propinas e pedalinhos bem mais modestos)? E por que o próprio presidente da J&F não saberia de nada do que se passava debaixo de sua sorridente dentadura?
Analisemos as duas hipóteses não metafísicas (por ora): a primeira, de que realmente não soubesse de nada; a segunda, de que era mais um dos bandidos hoje desmascarados, a começar pelo chefe – do Executivo – que o convidou para o ministério. Em ambos os casos, vale salientar, o ministro não deixaria de ser conveniente ao “Mercado”, para acabar de entregar-lhe o Brasil.
Já pelos indecifráveis critérios econômicos (e éticos) da Globo, cabe perguntar-lhe: se todos os chefes criminosos perderam o seu apoio irrestrito (os antigos, da J&F, e o Temer), por que enaltecer o maior cúmplice deles? E ainda que para o “mercado” o Meirelles fosse apenas um inocente útil – como o Lula e o PT formam uma quadrilha ameaçadora – por que a emissora apoiaria alguém tão ingênuo, ou distraído, na pasta mais importante da economia?
No plano metafísico, porém, vimos uma explicação satisfatória, nos patéticos apelos do inepto Meirelles, para que a população “orasse pelo nosso capitalismo” (vídeo). Talvez a Globo apenas louvasse um ministro genuinamente cristão – como os sócios estadunidenses, que também o estimam pelos mesmos motivos. Com efeito, não deixaria de ser um epílogo redentor para todos os capitalistas-cristãos da telenovela global.
Outros surrealismos neoliberais
De volta à realidade terrena, conquanto o Brasil não estabeleça limites à imaginação, não imaginaríamos um enredo ainda mais surreal do que os anteriores. Até nos depararmos com a portaria do ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira (do PTB), um insignificante pastor cristão que de repente se converteu num breve arremedo de “restaurador da escravidão”. Até a Miriam Leitão pareceu perplexa.
Não pelas condições materiais em si dos trabalhadores, que a duradoura “ministra” da economia global já provou ignorar (tanto quanto odeia o partido que os defende). Mas certamente se preocupou com as “imagens públicas” pelas quais ela se sente responsável: a do fantoche presidencial, que afinal exibia sua face mais “temerária”; a da emissora que criou o mais “novo” monstro neoliberal; e a de sua própria cara, como porta-voz da Globo, que sempre aplaudira os retrocessos golpistas desde que pudesse vendê-los como pilares de alguma “ponte para o futuro”. Já não era o caso dos escravos.
No entanto, após a escravidão que não foi restaurada (sem tampouco ter sido eliminada), recordemos a “ministra Porcina”, que igualmente foi, sem nunca ter sido – pelo mais longo período de vacância do Ministério do Trabalho, na história do Brasil. Não obstante, todos os espaços, ministeriais e midiáticos, foram ocupados pelos destemperos pessoais e condenações – trabalhistas! – da Cristiane Brasil (do mesmo partido “trabalhista” do ministro anterior).
Nesse contexto surrealista, seria desnecessário citar o ministro “curinga”, Raul Jungmann (do PPS), cujas deambulações entre os ministérios da ‘Defesa’ e da ‘Segurança Pública’, por ironia, de fato só visavam “segurar” a opinião pública, em defesa da “reputação” do usurpador. E assim se exumou a manobra diversionista da “intervenção militar” no Rio de Janeiro.
Basta resumir, portanto, seus efeitos desastrosos. Exceto talvez para a parcela descerebrada da população – os saudosistas da ditadura militar, os nazi-bolsonaristas e demais adeptos das escolas sem partido (nem aulas de História). Mas de uma forma ou de outra, tudo correu como previsto pelos fascistas “oficiais”, porque nos governam (?), sob o patrocínio da Globo.
Meses depois, o expediente meramente protelatório, com efeito, nada pôde fazer pela segurança do povo fluminense – senão humilhá-lo, e aumentar todos os índices de criminalidade do estado. Antes que tudo se diluísse na espetaculosa (e vergonhosa) prisão de uma centena e meia de inocentes, numa festa de subúrbio. Sem que ninguém fosse capaz de descobrir sequer quem matou Marielle Franco.
Conclusões estatísticas
Por outro lado, convém destacar os aspectos pedagógicos dos grandes fiascos e tragédias. Inclusive na avassaladora rejeição ao Temer; no bombardeio de promessas neoliberais da Rede Globo; ou na demolição do que restava da imagem das Forças Armadas – de confiabilidade, para alguns, ou quase “messiânica”, para os lunáticos.
Na pior das hipóteses, entre o improvável e as unanimidades, todas as estatísticas contribuíram para uma conclusão “virtualmente” consensual, ou seja, tão visível para os defensores sociais dos mais frágeis quanto para os apologistas das soluções de força: bendita a nação que não depende da brutalidade de suas tropas para governá-la!
A partir da linearidade das experiências militares, podemos voltar ao ponto de partida, com as estatísticas e conclusões para a outra “subespécie” (também identificável pelas características comuns a seus soldados). Neste caso, a exótica ‘seleção ministerial’, formada por seres humanos bastante específicos: realmente dotados de inteligência e livre-arbítrio, mas tão indiferentes ao sofrimento alheio quanto subservientes a uma potência estrangeira .
Em outras palavras, o que já seria improvável – em qualquer ‘seleção natural’ – corrobora também a nossa premissa: uma reunião de seres deliberadamente perversos, e comprovadamente medíocres, jamais seria obra do ‘acaso’. Como tampouco os seus aliados e métodos predatórios, para assegurar a sobrevivência da própria espécie.
Em nossa castigada sociedade, pelo mesmo caminho evolutivo (ainda que na direção inversa), somente os espíritos acometidos de grave deficiência mental – ou visual – continuarão a confundir os brasileiros mais lúcidos com o cortejo de horrores exibidos diariamente pelos oligopólios televisivos, e recordados aqui. Em suma, os demais espíritos evoluirão, cedo ou tarde.
Vemos estatísticas análogas também na democracia brasileira: ora apenas nos crentes em retóricas imateriais (“liberais” ou “messiânicas”) de criminosos consagrados – por provas materiais – ora nos demais enfermos do ódio, ou do egoísmo, que igualmente renunciam ao livre-arbítrio e à própria inteligência.
Mas todos, diante das destruições explícitas, insistem em atribuí-las ao ‘acaso’ (ou ao PT). E assim voltam a aplacar suas consciências nos telejornais da Globo. No paroxismo desse estado catatônico, os lobotomizados chegam a achar “natural” a prisão do Lula.
Graças aos deuses da Natureza (ou às estatísticas), já vemos os sinais da extinção “virtual” (e eleitoral) dessa espécie. Por outro lado, profecias à parte, ainda não vimos até onde vai o desespero terminal das bestas-feras. Que morrem matando.
Na melhor das hipóteses, a esperança e a Constituição dos brasileiros.
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